Decreto cria comissão estadual contra trabalho escravo no Pará

12/09/2007

Pará se tornou o 3º estado a criar instância com o objetivo de erradicar a escravidão contemporânea. Decreto foi assinado durante reunião itinerante da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) em Belém

Por Leonardo Sakamoto

Belém – A governadora Ana Júlia Carepa assinou, nesta quarta-feira (12), um decreto criando a Comissão Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo (Coetrae-PA) com o objetivo de unir esforços do governo estadual e de entidades da sociedade civil no combate à escravidão contemporânea.

Com o decreto, o Pará se tornou o terceiro estado a criar uma instância com tal finalidade, seguindo os passos do Maranhão e do Tocantins. A assinatura foi firmada durante a reunião itinerante da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) realizada no Palácio dos Despachos, localizado em Belém, capital do Pará.

Além da governadora, estiveram presentes no ato o ministro-chefe da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República, Paulo Vannuchi, e a diretora do escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, Laís Abramo, entre outros representantes que fazem parte de instituições e organizações que compõem a Conatrae.

O ministro Paulo Vannuchi destacou a importância da realização de um encontro no Pará – estado brasileiro que detém o posto de campeão em número de pessoas libertadas de condições análogas à de escravidão – e do envolvimento do governo nesse processo.

Plano estadual
Uma proposta preliminar do Plano Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo no Pará também foi apresentada por Ana Júlia Carepa. O Plano será discutido por integrantes do governo e representantes sociedade civil paraense em seminário previsto para os dias 3 e 4 de outubro, e deve ser lançado oficialmente no mês de novembro. De acordo com a proposta inicial, o plano inclui, por exemplo, a capacitação de professores da rede estadual para prevenir o trabalho escravo e o fortalecimento das polícias civil e militar do Pará para combater esse crime.

Outros programas do Executivo estadual, segundo a governadora, também devem contribuir para o combate à escravidão. Citou especialmente o Bolsa Trabalho, que pretende atender 120 mil jovens que, sem o benefício, acabam se tornando mais vulneráveis ao aliciamento para a escravidão.

Ana Julia recordou ainda que, como senadora, foi autora do projeto de lei (PLS 108/2005), que transforma em lei a “lista suja” do Ministério do Trabalho e Emprego – relação de empregadores e empresas flagrados utilizando mão-de-obra escrava – e proíbe aos relacionados o acesso ao crédito em qualquer instituição financeira ou a participação em licitações. Ressaltou também que assinou e vem dando cumprimento à Carta-compromisso contra o trabalho escravo, elaborada pela Repórter Brasil nas eleições do ano passado.

“Espero que a sociedade civil participe ativamente do monitoramento do Plano estadual. Até o momento, a formulação da proposta coube apenas à equipe do governo do Pará”, observa Xavier Plassat, representante da Comissão Pastoral da Terra (CPT) na Conatrae. Segundo ele, uma análise rápida do texto preliminar apresentado pela governadora revela alguns riscos no que se refere ao choque de competências com o governo federal. Além disso, Xavier ressalta que as iniciativas de geração de emprego e renda precisam ser melhor analisadas para verificar sua efetividade.

Pacto federativo
Idealizado pela OIT, a iniciativa de um pacto entre governadores pela erradicação do trabalho escravo recebeu o suporte do governo do Pará. Ana Júlia declarou que já encaminhou cópias de uma proposta redigida pela sua administração para os governadores de outros estados com alta incidência de uso de trabalho escravo, ou que são grandes fornecedores dessa mão-de-obra: Piauí, Maranhão, Tocantins, Bahia e Mato Grosso.

Entre as medidas previstas nesse pacto estão a criação de uma base de dados regional que forneça informações para serem utilizadas como subsídio para ações dos governos estaduais, o apoio à aprovação da proposta de Emenda Constitucional (PEC) 438/2001, que prevê o confisco de terra onde ficar comprovada a prática da escravidão, a realização de estudos e de colaboração técnica para combater o tráfico de pessoas e a assistência aos trabalhadores libertados.

Fariam parte desse acordo interestadual ainda a realização de um encontro para avaliação das metas do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, o apoio às ações do grupo móvel de fiscalização do MTE e a própria criação de comissões e planos estaduais para o combate ao trabalho escravo. A iniciativa estabelece também a importância do corte de incentivos e créditos estaduais para os empregadores que fazem parte da “lista suja”. A medida é um avanço, mas não incorpora atitudes mais restritivas como as que já foram adotadas em leis estaduais no Piauí, no Maranhão e no Tocantins, unidades federativas em que a contratação de empresas da “lista suja” pelo governo estadual já é considerada um ato ilegal.

Elogio e homenagem
No encontro em Belém, Ana Souza Pinto, da Comissão Pastoral da Terra de Xinguara (PA), destacou a importância do processo de descentralização do Ministério Público do Trabalho (MPT), que instalou escritório em Marabá (PA) e pediu mais recursos para a área.

Laís Abramo, da OIT, e Sebastião Caixeta, presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho fizeram ainda um agradecimento público à Patrícia Audi, que coordenou o projeto de combate ao trabalho escravo da OIT Brasil desde 2002, e se desligou oficialmente na semana passada. Patrícia foi uma das figuras centrais no processo que levou ao Brasil a ser reconhecido como um exemplo internacional na erradicação desse crime.